Billions, a série que está dando o que falar no Netflix, conta a história de um financista Americano, Bobby Axelrod (papel desempenhado muito bem por Damian Lewis, de Homeland e Band of Brothers, e supostamente inspirado na história de Steve Cohen, fundador da SAC Capital), e suas complicações com a justiça, encabeçada por Chuck Rhoades (Paul Giamatti, de John Adams e Sideways), o procurador geral de justiça de Nova York. 

A relação belicosa e por vezes doentia entre Rhoades e Axelrod fica ainda mais interessante quando se aprende que Wendy Rhoades, mulher de Chuck (papel desempenhado por Maggie Siff), é coach de performance da firma de Axelrod, um fundo de investimentos.

Rhoades é o que se pode chamar de coach interna dentro da firma. Ela tem um consultório dentro da sede do fundo, onde recebe os colaboradores (em sua grande maioria homens brilhantes e agressivos) para sessões de coaching que têm como objetivo único e exclusivo mantê-los performance no seu pico e ganhando mais dinheiro para a empresa.

Wendy Rhoades, a coach interna do fundo fictício Axe Capital, da série Billions

A performance de Siff é muitas vezes um retrato fidedigno da atuação de um coach: em alguns capítulos ela trabalha diretamente com Axelrod depois de uma crise nos números da empresa, ajudando-o a identificar respostas nas suas vozes internas, uma que diz que ele é um perdedor, e outra que diz que ele é um vencedor. Com ferramentas físicas e mentais, Rhoades consegue que ele foque na segunda voz, e volte animado para o trabalho. Dramatizações à parte, as ferramentas fazem sentido, e mostram a potência do coaching bem empregado.

A série vale nossa atenção apenas pela qualidade da trama, mas levantou uma questão muito interessante: a presença de coaches internos de performance em empresas.

Coaching como ferramenta de desenvolvimento organizacional 

O coaching é uma poderosa ferramenta de desenvolvimento organizacional. Há pesquisas que apontam que um trabalho com um coach pode ser mais eficiente para o desenvolvimento de um gestor do que outras iniciativas tradicionais de treinamento e desenvolvimento.

Algumas empresas, como a Keen.io, oferecem o acesso e os custos de um engajamento com um coach como benefício a todos os seus colaboradores. Em outras empresas, o acesso é severamente mais restrito, sendo dado somente a executivos sêniores, ou a profissionais passando por dificuldades de performance, e em alguns casos, é até visto como um mau sinal e carregado de estigma.

Os quatro estágios do coaching dentro de uma organização

Ad -Hoc: no estágio ad-hoc, não há qualquer estrutura que organize os esforços de coaching dentro da organização. Quaisquer relações de coaching que existem são iniciadas por indivíduos, e muito frequentemente pagas pelo próprio, que entende que há valor em fazer o investimento.

Organizado: no estágio seguinte, geralmente a empresa se dá conta que em um dado momento há uma série dos seus indivíduos fazendo coaching de maneira desorganizada e descentralizada. É quando a empresa decide manter algum tipo de acompanhamento do que está acontecendo, e eventualmente entra no circuito ajudando até a criar critérios de seleção de coaches. Quem cuida disso geralmente é um champion ou sponsor interno, possivelmente da área de RH.

Proativo: no estágio proativo, a empresa ganha mais clareza sobre os benefícios do coaching, e passa a empregá-lo como ferramenta principalmente voltada à solução de problemas pontuais do negócio. É quando uma área, liderada por um colaborador, por exemplo, está sendo lenta em se reorganizar ou implementar algum projeto. Nesse caso, também são atacados problemas como deficiências de liderança de líderes individuais, mudanças de cultura e assuntos relacionados. Por fim, é nesse estágio que começam eventuais esforços de implementação de forças internas de coaching, como a citada Wendy Rhoades, de Billions, que trabalham exclusivamente com clientes da empresa e estão na sua folha de pagamento.

Estratégico: no último estágio, o estratégico, esforços de coaching são integrados permanente e intensamente em todas as atividades da empresa, sendo usados de maneira proativa e constante no desenvolvimento de líderes, no desenvolvimento de capacidades e habilidades estratégicas. Aqui também é esperado que gestores sejam coaches de suas equipes, recebendo em muitos casos treinamento formal para tal. Apenas uma grande minoria das empresas chega a este estágio.

O gestor como coach

Gestores que agem como coaches de seus liderados são reconhecidos como ferramentas muito potentes de desenvolvimento, com impactos positivos na satisfação, engajamento e performance de colaboradores (ver Hamlin, Ellinger, & Beattie, 2006; e Jarvis, Lane & Fillery Travis, 2006). 

A ciência também mostra que coaching é um dos aspectos de liderança mais desejados por liderados em seus líderes, e no entanto estão entre os comportamentos menos observados. A maioria dos colaboradores busca um estilo de coaching nos seus gestores que seja facilitador, apoiador e mirado nas metas e objetivos dos colaboradores, mas acabam recebendo um estilo direcionados e orientado ao atendimento dos objetivos do gestor.

O papel do RH e de coaches internos

As áreas de recursos humanos estão frequentemente no olho do furacão do coaching nas empresas, devido ao seu papel de suporte e desenvolvimento dos gestores de uma empresa em temas como gestão de performance, busca e seleção de coaches externos e assessoria a gestores no desempenho de seus papéis do dia a dia. Há uma crescente expectativa, principalmente sobre os parceiros de negócios, ou business partners, para que ajudem a empresa e seus gestores com:

  • Aconselhamento e perspectivas aos gestores, na posição de conselheiros de confiança; 
  • Coaching e mentoring aos gestores nos seus desafios relacionados a pessoas; 
  • Suporte nos esforços de desenvolvimento e planejamento de talentos.

Coach interno x coach externo

Coaches internos, do tipo que aparece permanentemente nos quadros da empresa, têm algumas vantagens significativas sobre seus pares externos: eles têm muito mais chances de entender os desafios e as realidades de uma empresa por viverem dentro dela; têm oportunidades mais frequentes e mais detalhadas de observar seus coachees no dia a dia da empresa, complementando sua perspectiva; podem prover feedback e aconselhamento imediato, sem ter que esperar até a próxima data marcada. Tudo isso ajuda-nos a aconselhar seus coachees com mais eficácia.

Por outro lado, essa estrada também é cheia de desafios: há muito mais risco de o coach interno ser visto como cheio de conflitos de interesses, potencialmente infiel à relação coach-coachee, e isso pode fazer com que os colaboradores sob coaching sejam muito menos predispostos a dividirem a totalidade dos seus desafios e aflições com seus coaches; a priorização de esforços também pode ser extremamente difícil quando o coach interno possui algum outro tipo de ocupação dentro da empresa, como alguma função de especialista dentro do departamento de RH.

Em geral, coaches externos são mais eficientes para lidar com problemas dos executivos mais sêniores da empresa, que frequentemente precisam de ajuda para processar e decidir com informações extremamente sensíveis e possivelmente estratégicas, relacionadas ao futuro da empresa, ou quando os coaches internos não possuem a expertise, tempo ou credibilidade necessárias para um engajamento nesse nível da organização (esse não é o caso de Rhoades, que na série atende aos traders da firma assim como ao seu chefe, Axelrod).

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