Numa parceria com a Co Leadership, traduzimos este artigo escrito pelo co-fundador Edmond Lau, sobre o que torna um líder de um time de tecnologia eficaz. A versão original em inglês pode ser lida aqui.

A primeira vez que assumi um papel de líder de tecnologia, no início da minha carreira, eu não fazia ideia do que estava fazendo. Da noite pro dia, eu me tornei responsável pelos resultados técnicos e de projetos de um time de quatro engenheiros de uma humilde startup - apesar de não ter mais experiência, mentoria, ou ferramentas para minha nova função do que tinha no dia anterior, quando ainda era apenas um colaborador individual sênior. Estava numa situação “ou vai ou racha”. Me esforcei pra resolver as coisas trabalhando de 60 a 80 horas por semana. E cometi muitos erros.

Certa vez, eu estava de férias (muito necessárias) no Havaí. Durante uma trilha em um vulcão com a minha esposa, recebi uma mensagem de texto do meu CTO: “O processador de logs não está funcionando”. O processador era um software essencial, que analisava todos os dados de logs dos clientes e gerava um relatório que eles utilizavam para decisões de negócio. E eu era o único engenheiro que conhecia o código - em parte porque o time já tinha muitos projetos, e em parte porque eu não queria sobrecarregar mais ninguém com aquilo.

Aparentemente, não há Wi-fi em vulcões. E portanto as expectativas de clientes e do meu time pesaram na minha consciência durante todo o dia, até que eu consegui consertar o problema de noite. Eu aprendi uma difícil lição aquele dia, sobre não ser o único ponto de falha de um time. E aprendi muitas outras lições desde então, tanto nas minhas próprias experiências quanto de conversas e entrevistas com centenas de engenheiros e líderes do Vale do Silício, quando escrevi The Effective Engineer. É claro que todo mundo passa por dificuldades similares em liderança na área de tecnologia, e essas histórias não são só minhas.

Por isso, me animei quando a Dropbox me recebeu na sua sede em São Francisco como palestrante durante o treinamento interno de liderança em times de tecnologia. Durante 90 minutos, eu respondi perguntas de aproximadamente 50 líderes de tecnologia da Dropbox sobre uma série de assuntos: como definir seu papel; como priorizar o trabalho individual vs trabalho em equipe; como testar novos processos em equipe; e assim por diante.

Um tema, no entanto, surgiu na maior parte das perguntas. E era: “O que é ser um líder de tecnologia bem sucedido?”

Neste artigo, eu divido um framework para pensar sobre sucesso como um líder de tecnologia.

O líder de tecnologia tem mil facetas

Quando eu reflito sobre os mais bem sucedidos e eficazes líderes de tecnologia que conheci, eles não se encaixam em um só molde.

Um era um líder eficaz porque era um dos melhores engenheiros de front-end da indústria (suas outras habilidades técnicas também eram ótimas), não tinha medo de mergulhar em bases de código Webkit e Chromium para entender o que estava acontecendo e construiu ferramentas e abstrações que elevaram perceptivelmente a produtividade e a qualidade do código do time todo.

Outra era muito efetiva como líder porque ela construiu relacionamentos forte com times adjacentes, adquiriu um profundo conhecimento técnico sobre a área de projetos do time dela, e desenvolveu uma forte habilidade de liderar esforços de vários times em conjunto que foram importantes para a organização como um todo. Outra conseguia memorizar detalhes elaborados e ideias, pensar sistematicamente e racionalmente em casos complicados e motivar o time a executar projetos ambiciosos com alto grau de complexidade técnica.

E outro era um líder eficaz porque ele conseguia cumprir vários papéis: podia usar sua habilidade “satisfatória” em design para rapidamente esboçar modelos de produto, transformá-los em documentos de design de produto para conseguir feedback, e então sistematicamente iterar, testar e medir a eficácia dessa ideias com o time dele.

É possível se tornar um líder eficaz de tecnologia por estar no top 1% da sua área técnica. Mas é algo muito difícil. É bem mais fácil ser muito bom (top 25%) em alguma área. E portanto, um modelo muito mais comum para sucesso em liderança na tecnologia é essa Regra do Três, inspirada em Scott Adams: Se torne muito bom (top 25%) em três coisas. Depois descubra como combinar essas habilidades para efetivamente tocar projetos importantes.

As três coisas que você escolhe para se especializar vão depender fortemente das suas aspirações a longo prazo. Você gosta de trabalhar com produtos focados no usuário? Algumas coisas para se especializar podem incluir engenharia de front-end, pesquisa de usuários, ou design de interação. Você quer explorar administração algum dia? Algumas coisas podem incluir mentoria ou coaching, rodar retrospectivas efetivas ou fazer o onboarding de novos membros no time. Você quer fazer algo mais empreendedor? Algumas coisas podem incluir gerenciar produtos, entender as necessidades do negócio, ou o crescimento de usuários.

Desenhe sua própria função de líder de tecnologia

Depois de identificar as três coisas que você faz muito bem (ou que você quer fazer muito bem), você precisa explicitamente desenhar com seus colegas como alavancar essas habilidades.

Essa é uma das maiores dificuldades em ser um líder efetivo de tecnologia, por uma série de razões. É difícil porque você pode não ter uma articulação clara do seu papel - isto é, assumindo que você é formalmente reconhecido como líder de tecnologia. Frequentemente engenheiros sênior assumem esse papel informalmente. É difícil porque, diferentemente de um gerente, você lidera um time de pessoas para produzir resultados, mas muitas vezes sem ter autoridade explícita.

E é difícil porque apesar de ter um conjunto de responsabilidades muito diferente de um colaborador individual - você está começando a liderar reuniões, priorizar tarefas para o time, dar mais feedback direto e motivar pessoas - você pode não ter tido muito (ou nenhum) treinamento ou apoio sobre como ser bem sucedido nisso.

E, no entanto, o líder de tecnologia tem um papel importante, porque você é de alguma forma responsável por aspectos da estratégia técnica, qualidade do produto, produtividade do time e resultados de projetos.

Para ser bem sucedido, você precisa explicitamente desenhar como seu papel de líder de tecnologia será. Isso pode ser divertido (Wow! Existem tantas possibilidades!) e assustador (Socorro! Existem tantas possibilidades!) simultaneamente.

Para escolher sua própria aventura, primeiro você precisa entender o que é importante para entregar projetos.

Como definir seu próprio papel como um líder de tecnologia eficaz

Num alto nível, líderes de tecnologia eficazes garantem que projetos de alto nível sejam entregues.

Projetos podem ser definidos como produtos, features, experimentos, ferramentas, sistemas, refatoramento, e assim por diante. Até que os projetos sejam entregues, resultados não se materializam.

No entanto, somente entregar projetos não é suficiente. Em The Effective Engineer, eu compartilho que a alavancagem - o impacto que você produz pelo tempo investido - é a métrica central, o guia, utilizado por engenheiros eficazes. O mesmo vale para líderes de tecnologia eficazes. Eles entregam projetos com um alto retorno sobre o investimento. Para qualquer projeto ser bem sucedido, ele precisa ir bem em várias dimensões-chave:

  • Técnica: Quais decisões técnicas e tradeoffs precisam ser feitos? Quais são os maiores riscos técnicos? 
  • Produto/Negócio: Por que esse é o projeto correto para entregar do ponto de vista do produto ou do negócio? O que tornaria esse projeto bem sucedido? Quais são seus objetivos? 
  • Pessoas: Quem está trabalhando nesse projeto? Como motivar e tornar eles responsáveis pelo seu trabalho? O que é importante para os stakeholders do projeto? Quais tarefas podem ser influenciadas por outros times? 
  • Gerenciamento do projeto: O que precisa ser feito, até quando, e em que ordem? Quem precisa saber de cada coisa?

Muitos líderes de tecnologia cometem o erro de assumir que só são responsáveis pela dimensão técnica - o termo "líder de tecnologia" certamente contribui para essa visão.

A realidade é que os projetos são bem sucedidos ou falham mais que seus méritos técnicos. Meu time pode construir uma ótima ferramenta ou abstração com um código limpo e seguindo fortes padrões de design, mas se resolve o problema de negócio errado, ou consome mais recursos que a organização pode arcar, ou meus colegas não se sentem bem com a experiência de trabalho, então podemos ser mais eficazes.

Isso não quer dizer que, como um líder de tecnologia, você deva cobrir todas as dimensões sozinho. Mas você precisa se certificar de que as diferentes responsabilidades do projeto sejam divididas.

E isso requer que você desenhe suas alianças de maneira explícita, junto a outras pessoas do time.

Você e as pessoas com quem trabalha - independentemente de ser um gerente de produto, um gerente de engenharia, um gerente de projeto, um designer ou outros engenheiros - são aliados no projeto. Cada um traz uma combinação de habilidades e aspirações diferentes. O que você quer, o que você faz bem, vai variar quando comparado a outros líderes de tecnologia.

Portanto, para ter uma função eficaz, você precisa ter uma conversa explícita para desenhar as relações com as pessoas com quem trabalha. É uma das tarefas de mais alta alavancagem que você pode realizar como líder de tecnologia.Isso significa se questionar (e ser questionado) sobre:

  • O que é importante para você no trabalho em conjunto?
  • O que define o sucesso desse projeto?
  • Qual é a melhor forma de pedir sua ajuda?
  • Qual é a melhor forma de compartilhar feedback com você?

Qualquer outra coisa que você ache importante explicitar sobre trabalhar em conjunto também é válido.

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