Se você já teve algum envolvimento com qualquer assunto relacionado à área de RH — seja como líder ou parte de um time de Gente e Gestão — provavelmente você já ouviu um dos jargões mais conhecidos desse segmento: o famoso “RH estratégico”.
Ele é um conceito altamente difundido na comunidade de Gestão de Pessoas e está presente em diferentes conteúdos voltados para o público de RH, que, não raro, trazem propostas milagrosas como “Os 5 passos para fazer o seu RH ser mais estratégico”.
Esse termo é usualmente utilizado sempre que se deseja dar mais importância, voz, ênfase e visibilidade para as atividades do RH.
O problema é que, além do “RH estratégico” ser uma expressão utilizada frequentemente de forma vazia, sem um significado claro e tangível, pouco se fala do que o "RH estratégico” representa na sua essência; do que ele realmente é.
Nesse artigo, te convido a expandir a nossa consciência com relação ao significado dessa expressão comum do mundo da Gestão de Pessoas e, indo além, apresentar ferramentas práticas para que o RH consiga ter, de fato, uma atuação mais estratégica, agregando valor para o seu principal cliente: o negócio.
O que é ser estratégico?
No livro “The coaching habit”, o autor defende a tese de que, de forma geral — e não somente aplicada ao contexto de RH — o termo “estratégico” é um qualificador utilizado em excesso para tudo que se deseja soar como mais importante, mais nobre ou elevado.
Expressões do tipo “esse não é um relatório qualquer, é um relatório estratégico”, representam bem essa ideia de que o termo “estratégico” é utilizado, muitas vezes, só para dar ênfase em algo que é (ou deveria ser) relevante.
Podemos expandir essa reflexão também para outros chavões que pouco significam algo prático — e que estão presentes aos montes no mundo corporativo — como os termos disruptivo, ágil e RH 4.0.
Voltando a nossa discussão para o RH, durante a minha formação na disRHupt eu aprendi dois grandes insights com a Michele Martins no seu artigo provocativo “Você ainda se refere ao seu RH como RH Estratégico?”:
- Só existe uma estratégia a ser seguida: a estratégia do negócio. O trabalho das pessoas é fazer essa única estratégia acontecer — e não criar uma estratégia própria para chamar de sua, independente da área de negócio que estamos falando;
- Rotular um time de RH que realmente agrega valor para o negócio como “RH estratégico” é uma redundância desnecessária, quase que um pleonasmo. E cá entre nós, você já ouviu alguém do time de Vendas da sua empresa ter que se (auto)afirmar como estratégico? Isso diz muita coisa!
Não me entenda mal, não estou defendendo a abolição do termo “RH estratégico” do vocabulário do RH. Estou somente provocando uma reflexão que vai além do vazio envolvido no discurso do “RH estratégico”, buscando entender o que ele realmente representa; no que ele realmente agrega valor.
Para garantir que estamos usando a mesma definição, vamos combinar que RH estratégico é aquele que agrega o máximo de valor para os principais desafios do negócio, no momento certo, na medida certa.
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O que impede o RH de agregar mais valor para o negócio?
Ao longo dos últimos anos trabalhando com times e lideranças de RH, percebi algumas disfunções que se repetem em diferentes times de Gestão de Pessoas. Acredito fortemente que essas disfunções são fatores que impedem o RH de agregar mais valor para o negócio.
Obviamente que não dá para generalizar: existem RHs que são referência em muitos dos temas que vou listar abaixo. A minha reflexão é que já vi essas disfunções com frequência e, considerando que o primeiro passo da mudança é conhecê-las, irei compartilhar, para caso você se identifique com alguma delas.
Na minha visão, as principais disfunções do RH que o impede de agregar mais valor para o negócio e, portanto, ter uma atuação mais estratégica, são as seguintes!
Pouca conexão do RH com os desafios da organização
Venha comigo imaginar uma historinha exagerada para conseguirmos tangibilizar essa ideia: Imagine que é segunda-feira, final de tarde, início de dezembro e a CEO de certa empresa está super preocupada com o péssimo resultado financeiro que se obteve ao longo do ano, temendo ter de demitir parte do quadro de pessoas para não ter que “fechar as portas” no ano seguinte.
No próximo dia, terça-feira pela manhã, essa mesma CEO entra em uma reunião e ouve que a liderança do time de RH está preocupadíssima com o orçamento curto para a confraternização de final de ano, dizendo que não sabe se irá conseguir manter a mesma banda e o mesmo buffet que foram um sucesso no ano anterior.
A reflexão é simples. Troque a "banda" e o "buffet" por qualquer outro assunto que não esteja ligado com "manter o negócio de pé", e falhe com sucesso em ter um RH estratégico.
Esse foi um exemplo exagerado, eu sei. Mas reflete bem o quanto o RH precisa estar atento às necessidades do negócio e focar as suas ações para agregar no que é mais importante, no momento e na medida certa.
Dificuldade de divulgar o seu impacto em números
Por natureza, a área de Pessoas é mais subjetiva do que outras áreas do negócio (como os times de vendas e financeiro). Falar de desenvolvimento, por exemplo, parece algo "abraçador de árvore", mas não é.
Por ser uma área mais subjetiva e, por isso, produzir resultados menos tangíveis para o negócio, os times de RH possuem um desafio a mais para divulgar o seu impacto.
Para conquistar o seu espaço, o RH precisa falar a mesma língua das principais lideranças e divulgar o seu impacto em números. A importância desse ponto é potencializada quando não se tem uma pessoa de RH na diretoria da organização, já que se torna ainda mais distante a interação da alta gestão com os resultados do time de RH.
Uma forma de resolver essa questão é por meio da implementação da conhecida área de People Analytics, que auxilia o RH na gestão e divulgação, em números, do impacto das suas ações — como:
- as melhorias nas pesquisas de clima trimestre contra trimestre;
- aumento do atingimento de metas posterior a uma rodada de treinamentos, o desafiador “ROI de treinamentos”;
- correlação estatística entre o resultado da avaliação de performance e turnover, dentre outras análises possíveis.
Pouco conhecimento sobre o negócio
Em qualquer área do trabalho é fundamental que o fornecedor de um serviço ou produto entenda profundamente quem é o seu cliente, quais são suas dores e necessidades. No RH não é diferente!
O RH serve ao negócio e, por isso, é necessário que entenda como o negócio produz dinheiro, qual o seu modelo de atuação, perfil dos clientes, concorrentes, principais métricas dos times internos que atende e muito mais.
Esse conhecimento é importante para que o RH tenha bagagem o suficiente para discutir de “igual para igual” com os seus clientes e, assim, se torne, de fato, parceiro do negócio — desenhando soluções que atendam a demanda que o negócio precisa.
Um livro interessante que fala sobre essa dinâmica de conhecer mais de negócios, independente se você é ou não uma pessoa de RH, é o livro “O que o CEO quer que você saiba”, do renomado Ram Charan. Vale a pena considerar para a sua próxima leitura, caso queira explorar mais sobre esse tema!
Conhecer e refletir sobre essas disfunções é o primeiro passo para uma atuação mais estratégica do RH nas empresas.
Legal, Silas! Mas como o RH pode agregar o máximo de valor para o negócio?
A resposta dessa pergunta é simples e pode ser respondida em dois pontos. O RH agrega o máximo de valor para o negócio quando:
- Entende de forma profunda o negócio, seu momento, oportunidades, dores e riscos;
- Cria soluções personalizadas, feitas sob medida, no tempo certo e que resolvam os problemas que a organização possui.
A provocação é termos menos produtos de RH de prateleira (só porque os RHs das outras empresas estão fazendo) e mais produtos de RH conectados com as necessidades do negócio!
Com isso, podemos concluir que o primeiro passo para o RH agregar o máximo de valor para o negócio e, assim, atuar de forma mais estratégica, é garantir que se tenha feito um ótimo diagnóstico da organização, profundo e detalhado do: momento, dores e necessidades do negócio!
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3 maneiras para fazer um excelente diagnóstico do negócio
Apesar de ser fácil falar, executar um excelente diagnóstico do negócio não é tarefa fácil e, para tornar esse processo menos complexo, gostaria de compartilhar três maneiras de realizar um diagnóstico de alto nível do negócio da sua empresa.
Conheça a Curva de Greiner
A Curva de Greiner é uma ferramenta da administração apresentada na forma de um gráfico que demonstra as 6 principais fases que a maior parte das empresas passa desde a sua fundação, juntamente das crises que o negócio enfrenta em cada uma dessas fases.
No eixo vertical, temos o tamanho da organização em número de pessoas e receita e, no eixo horizontal, temos o tempo de vida da organização:
Em estágios iniciais — na fase 1, por exemplo — existe usualmente uma crise mais forte de liderança, onde pessoas pouco preparadas assumem cargos de gestão e, por isso, desenhar ações de RH e estar mais próximo da liderança pouco preparada é algo que pode ser visto como um tema estratégico para o RH que está nesse estágio.
Ao mesmo tempo que, para empresas avançadas na sua estrutura — que já realizam alianças e fusões com outras empresas, que estão na fase 6 do gráfico acima — o desafio passa a ser lidar com a crise de identidade cultural da organização, levando o RH a intensificar os trabalhos de cultura organizacional, por exemplo.
O RH que compreende bem essa ferramenta aumenta as suas chances de correlacionar de forma mais acertada o sintoma que a organização está demonstrando com o tratamento adequado para cada caso.
Caso você queira saber mais sobre a Curva de Greiner, que foi abordada de forma breve neste artigo, sugiro a leitura desse conteúdo.
Além disso, outra ferramenta similar que também pode ser útil para o RH no contexto de identificação das dores de negócio ao longo do seu crescimento é o Blitzscaling, conhecido por “explicar” o crescimento de famosas empresas de tecnologia como LinkedIn, Amazon e Waze. Caso você tenha interesse, vale a pena checar este artigo aqui.
Rode pesquisas (dos diversos tipos) para colaboradores
A execução de uma boa pesquisa pode ser uma ótima maneira para descobrir os pontos fortes e as fragilidades do negócio e, com base nisso, fornecer insumos para que o RH trabalhe de forma direcionada no que é mais importante, no que muda o jogo!
É por meio dessa ferramenta que é possível identificar, por exemplo, o que deve ser feito para evitar a evasão das pessoas top performers na sua empresa e quais ações devem ser tomadas junto da liderança para promoverem um melhor desempenho nas suas atividades com as equipes.
Volto aqui com a reflexão central desse conteúdo: por meio das pesquisas, o RH consegue vestir as lentes do negócio e entender onde pode agregar o máximo de valor, onde "dói" mais.
Indo além, a realização das pesquisas é uma excelente forma do RH agregar mais dados ao seu escopo que sofre de uma carência estrutural de indicadores. Com isso, se torna possível divulgar o seu impacto em números e ganhar mais espaço nas tomadas de decisões do negócio com as demais lideranças da organização.
Entenda as principais métricas e resultados do negócio
Metas indicam prioridades. Entender quais são as principais métricas do negócio equivale a entender quais são as principais prioridades do negócio.
É importante também que as pessoas da área de RH saibam como estão os resultados dessas métricas: seus desvios, quais metas estão indo bem, quais estão indo mal, bem como quais as causas que justifiquem tais resultados.
Essa aproximação forte do RH com o entendimento profundo das métricas do negócio é um fator chave para gerar mais valor no que realmente importa, pois é a partir desse diagnóstico que o RH poderá desenhar processos e práticas a fim de garantir que as pessoas se desenvolvam no que é mais crítico e tenham um ambiente propício para que a organização produza os resultados que almeja.
Espero que esse conteúdo tenha cumprido o seu objetivo de expandir a nossa consciência com relação ao real significado da expressão “RH estratégico” e que, a partir dessa reflexão, o RH agregue mais valor ao que realmente é estratégico: as necessidades do negócio!
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